I. Sabia que a noite lhe trazia o abrigo. Na sua passada larga e segura, continuou a afastar involuntariamente as pedras invisíveis que se lhe atravessavam à frente dos pés, como que a travar-lhe o caminho. Não precisava de ver muito para saber as veredas a percorrer e conhecia todos os buracos da serra, onde podia esconder a carga e onde podia aninhar-se se pressentisse algum guarda-fiscal dos que não eram dos conhecidos, próximos, companheiros. Os seus davam sinal. No bolso do casaco pesava-lhe a pistola, que o arreliava como andar à chuva, mas que trazia por necessidade. Só a usava nestas andanças e mal chegava a casa, arrumada a carga no baixo, pegava nela e metia-a atrás duma pedra solta na parede atrás da porta que dava para as escadas. Ainda era preciso vencer o rio, agora difícil de atravessar com tanta carga, e a serra toda de alto a baixo até chegar a casa e tinha que o fazer antes dos primeiros sinais de luz. Os movimentos apressados das pernas negavam...